O outro

Mania humana: enxergar no outro o diferente. Exercer nele todo tipo de discórdia. E julgá-lo moralmente sem despir-se da própria moral. Ignorar suas qualidades, somente pelos seus defeitos. Fazer dele escravo do mundo. Ser-lhe indiferente. Encará-lo como pedra: o concreto que ergue "estranhas catedrais". E buscar em Deus legitimidade para isso.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Despressurização

Essa vida de concursando às vezes dá a sensação de que você está numa cabine de aeronave despressurizada, sem direito a máscaras de oxigênio.

Mas às vezes umas pessoas aparecem para oxigenar nossas mentes.

Aconteceu outro dia: tive a oportunidade de presenciar a primeira reunião do grupo de pesquisa Matrizes autoritárias do processo penal brasileiro: para além da influência do Código Rocco (1941).

O tema proposto foi ideia do Prof. Geraldo Prado, que orienta e coordena o grupo, mas a reunião mostrou - e os e-mails também têm mostrado - que tem muita gente que quer trabalhar. Discussões? Algumas, ainda incipientes, mas suficientes para revigorar a nossa vontade de saber e fazer mais. E todos lá, me parece, querem saber e fazer mais.

Cabine pressurizada.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Pés e mãos Brasil afora

A gente quando vê céu preto demais sai correndo, salto alto e sombrinha na mão.

Tem gente que quando vê céu limpo demais sai andando, pé descalço e trouxinha na mão.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Reminiscências atuais

Entrou em vigor ontem a Lei 12.234/2010, que altera as disposições do Código Penal sobre prescrição, aumentando um dos prazos e proibindo a prescrição retroativa.

Em homenagem a ela, colaciono aqui o Hino de Duran, de Chico Buarque, música de 1979, mas bastante atual, por sinal.

 

Se tu falas muitas palavras sutis
E gostas de senhas, sussurros, ardis
A lei tem ouvidos pra te delatar
Nas pedras do teu próprio lar
Se trazes no bolso a contravenção
Muambas, baganas e nem um tostão
A lei te vigia, bandido infeliz
Com seus olhos de raio-x
Se vives nas sombras, frequentas porões
Se tramas assaltos ou revoluções
A lei te procura amanhã de manhã
Com seu faro de dobermann
E se definitivamente a sociedade só te tem
Desprezo e horror
E mesmo nas galeras és nocivo
és um estorvo, és um tumor
A lei fecha o livro, te pregam na cruz
Depois chamam os urubus
Se pensas que burlas as normas penais
Insuflas, agitas e gritas demais
A lei logo vai te abraçar, infrator
Com seus braços de estivador
Se pensas que pensas...

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Quem pode, pode; quem não pode se sacode (normalmente na cadeia)

Já que pediram, e fui hoje mesmo ao Maracanã dar aquela caminhada, não custa postar aqui o choque de ordem da nossa prefeitura, que envolve ações contundentes contra os flanelinhas.

Num cartaz nas grades do estádio está escrito: 

"Dê um cartão vermelho ao flanelinha. Utilize os estacionamentos legais." 

Isso ao lado de um brasaão da prefeitura, assinado pela Secretaria Especial da Ordem Pública (o quê mesmo?).

Por falar em Secretaria da Especial da Ordem Pública, olha o que achei no site do órgão:

Choque de Ordem prende flanelinha com 15 chaves de veículos no Santos Dumont

Ação também rebecou 24 veículos estacionados irregularmente no entorno do aeroporto

04/02/2010

Uma operação Choque de Ordem, deflagrada no final da manhã de hoje por agentes da Secretaria Especial da Ordem Pública (Seop), prendeu há pouco um guardador de carros que prestava serviço ilegal de "Valet Flanelinha" no entorno do Aeroporto Santos Dumont, no Centro.
O "flanelinha" foi levado para a 5ª DP (Mem de Sá), juntamente com as 15 chaves de veículos que ele mantinha consigo. Durante a ação, outros 24 veículos estacionados irregularmente foram rebocados.
Participam do Choque de Ordem agentes da Subsecretaria de Operações e 12 reboques da Coordenadoria de Fiscalização de Estacionamento e Reboques (CFER) da Seop.

Podiam também noticiar esta ementa:

EXTORSÃO (ART. 158, §1.º, C.P.). FLANELINHAS. ATIPICIDADE. ABSOLVIÇÃO.O tipo da extorsão contém a elementar da "indevida vantagem econômica", que deve estar abrangida pelo dolo do agente, cuja conduta deve ser dirigida à especial finalidade de obter a vantagem que SABE indevida. Há dúvida se os acusados tinham consciêcia de que o valor que pediam às vítimas era indevido, pois, ao afirmarem que estavam trabalhando como flanelinhas, eles demonstram que entendem absolutamente legítima a referida cobrança, que seria fruto do seu trabalho.O conceito "indevida vantagem" deve ser cuidadosamente valorado pelo juiz, considerando as circunstâncias do caso concreto, especialmente as condições pessoais dos agentes, sua condição social, educação, cultura, enfim, sua capacidade de compreender que a conduta criminosa, sob pena de responsabilizá-los objetivamente.O Art. 20, caput, do Código Penal prevê o atuar em "erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime", e determina que, em casos assim, o próprio dolo está excluido, e não há crime, restando atípica a conduta E a divergência nem era sobre o valor a ser pago, mas sobre o momento desse pagamento. A vítima estacionou o carro e nada pagou - a vítima não fez nem deixou de fazer alguma coisa em razão da inocorrida "grave ameaça".absolvição.Recursos providos.

(TJRJ. Quinta Câmara Criminal. Rel. Des. Sérgio Verani. Julgamento: 21/05/2009)
Ufa! Desabafei.