O outro

Mania humana: enxergar no outro o diferente. Exercer nele todo tipo de discórdia. E julgá-lo moralmente sem despir-se da própria moral. Ignorar suas qualidades, somente pelos seus defeitos. Fazer dele escravo do mundo. Ser-lhe indiferente. Encará-lo como pedra: o concreto que ergue "estranhas catedrais". E buscar em Deus legitimidade para isso.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Da rotina do deserto

Depois da rotineira e ríspida discussão sobre o porvir político e pequeno que desejava, ela atravessaria atordoada um campo repleto de gatos. Os gatos procriar-se-iam em crescente exponencial a cada dia, mas ela não perceberia a diferença dos números. A beleza das árvores, dos lagos, dos peixes, dos perus, dos pavões, das cotias, dos patos e das pontes não se esconderia jamais atrás do descuido do poder público. A travessia, porém, seria alheia a tudo. Terminaria num deserto de comerciantes que imporiam a qualidade de seus produtos na voz. Seriam tantas as vozes, roucas, plenas, agudas, graves, fanhas, molecas, sérias... Vozes de rádio fazendo marketing primitivo. Mas nenhuma delas se sobreporia às das cenas das rotineiras e ríspidas discussões sobre o porvir político e pequeno que desejava. Ela passaria por predinhos antigos, com fachadas destruídas e restauradas. Neles, porém, enxergaria um dedo em riste contra sua cara. Pararia à frente de restaurantes com odor de gordura, mas o cheiro de mofo das instalações do centro acadêmico ainda impregnariam sua memória. Esbarraria em mulheres vestidas a veludo. Só o que poderia sentir na pele, contudo, seria o suor nas pernas provocado pelo couro do sofá.
Provaria uma especiaria oferecida por um vendedor, mas o gosto da adrenalina misturada à saliva esconderia o ardor da pimenta
Ela atravessaria aquele deserto todos os dias. Todos os dias no deserto à sua volta e no oásis dos seus pensamentos.
Tão alheia a tudo que só poderia se dar conta anos depois, quando passaria por ali e perceberia como havia triplicado o número de gatos naquele campo, como os predinhos eram graciosos - e que pena que estariam tão destruídos -, como aquelas vozes a irritariam, como o cheiro de gordura lhe provocaria ânsia, como se esbarrariam com frequência as pessoas por ali.
Finalmente, provaria uma pimenta deliciosa e, sem titubear, levraria um frasco à casa.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Ficção ou realidade?

Foram estas as palavras que Gabriel García Marquez atribuiu ao general Moncada, quando, sentenciado à morte, foi indagado por Aureliano Buendía, com quem trocou segredos de guerra do lado oposto, se não teria feito o mesmo contra ele caso os conservadores estivessem no comando do então município de Macondo:
"Provavelmente. Mas o que me preocupa não é que me fuzile, porque ao fim e ao cabo, para pessoas como nós esta é a morte natural. O que me preocupa é que de tanto odiar os militares, de tanto combatê-los, de tanto pensar neles, acabou se tornando como um deles. E não há um ideal na vida que mereça tanta abjeção. Neste passo, não só será o ditador mais despótico e sanguinário de nossa história, mas acabará fuzilando minha comadre Úrsula tratando de apaziguar sua consciência."
Lembrando que Úrsula é mãe do coronel Aureliano e contrária ao fuzilamento.
Alguma coincidência com a realidade?

domingo, 17 de maio de 2009

Ai,ai...

Tô precisando estudar. Alguém aí dá uma força?

sábado, 9 de maio de 2009

Conheceram-se numa boate em São Paulo. Ele mauricinho, dizendo que trabalhava em banco. Ela arrumada, dizendo que tinha namorado. Não faria diferença, ele estava interessado em outra mulher. Mas no dia seguinte a procurou. Ela já sabia o que queria da vida e não tinha paciência para cantadas inúteis. Mesmo assim, ele esteve no Rio de Janeiro, no carnaval. Queria encontrá-la, mas mal conseguiu. Ela também não tinha saco para encontros casuais. Ele voltou à garoa, e ela nem tinha saído do lugar. Enquanto ela bebia cerveja no centro da cidade, num papo revolucionário sobre exploração bancária da população de baixa renda, ele bebia vinho na Vila Madalena, explicando como o spread havia aumentado e a inadimplência diminuído, mesmo com as taxas lá em cima. Ele voltou para o Rio, mas evitou o papo do spread. Preferiu falar de comunismo e mostrar que gostava da Lapa. Ela curtiu um pouco e voltou a São Paulo no fim do ano. Não deixava de estar decidida, mas desta vez ela queria. Estava, porém, desistida. Ainda assim, ele a levou a uma pizzaria, onde encontraria alguns amigos malucos e/ou divertidos. Depois sugeriria uma balada. Ela acompanhou a noite. O amigo os deixou sozinhos. E sozinhos eles foram embora...

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Em terra de santa cruz...

Quero registrar a resposta do Deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) ao programa CQC, na cobertura do fim da bagunça das passagens aéreas. O diálogo foi algo como isto: como sempre, Danilo Gentili fez uma pergunta irônica, do tipo "o Sr. gostou do fim da farra das passagens?", mas não obteve resposta. Depois da terceira tentativa, o monólogo virou diálogo parecido com este: - A imprensa não deveria se meter no que acontece no Congresso. Ligeiro comentário: não que eu considere a imprensa responsável, até porque ela sempre soube dessa bagunça e nunca publicou nada a respeito. Bom, pelo menos alguém de bom senso finalmente resolveu falar, né? Continua o diálogo: - Ah, não?! Por quê? - Porque ela não paga nada aqui dentro. - Ah, eu pago: fui eu que paguei a construção daquela parede ali, ó. E o seu salário eu também pago. Agora, observe a resposta: - O povo também paga e não vem aqui reclamar! Olha... sem comentários!

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Parafraseando...

Sabedoria é a consciência de ignorar.